segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Audaxterra - virando a página e provocando o debate

É sempre bom dar um desfecho aos eventos realizados. Gostaria de começar agradecendo a todos que deixaram suas casas e vieram a Urussanga, pela confiança depositada na organização. Impossível não se sentir contagiado com o espírito e animação dos sul-caxienses, videirenses, florianopolitanos, paulistas (Reuel incluso), curitibanos, pessoal da serra catarinense, Negão e Kassulke do norte do Estado, o solitário Viramesa de Maringá, além dos “locais” do sul do Estado. Bom que se diga, os videirenses vieram com uma comitiva pronta pra tudo. Enquanto três estavam inscritos no evento, pelo menos outros seis fizeram um cicloturismo dentro do percurso da prova, largando junto dos participantes, aparatados como manda o figurino (coletes refletivos e tudo) e fazendo da largada o PC2 e partindo às 5h da matina para o PC3. Fomos informados que não se perderam, mesmo de noite e sem ajuda de tochas ou cal pedra espalhado na via, prova de que o percurso estava bem sinalizado (bampeado) e a carta de rota bem aferida.
Este foi o quarto evento de longa distância em que participo da organização, todos muito difíceis e desafiadores por si sós. Brasileiro, quando se trata de evento de longa distância, comporta-se como se estivesse numa votação eleitoral, ou seja, não quer desperdiçar seu voto. Que mal há em sair de casa e não conseguir completar um desafio?! Aliás, para mim, um evento deixa de ser desafio se sua conclusão estiver praticamente certa, salvo um problema mecânico inesperado e que não possa ser solucionado. O Audaxterra, em eventuais futuras edições (homologado dentro da Lei Brasileira de BRMs), não perderá a essência de ser um desafio por si só, apesar de realizado na distância “colegial” de 200 Km.
Não posso esquecer o corpo de voluntários. Os “frentes” eram eu (Maico) e o Ciro Damiani. Sempre a nos auxiliar esteve o Augusto da Bike Point. No dia do evento e nos dias que o antecederam, o Sachett foi peça fundamental de nossa estratégia. Além de ter dado a ideia do cal pedra na estrada, mostrou muita desenvoltura no manuseio do material, sujando o carro do Ciro como ninguém jamais o fez(rá). 160 Kg de cal foram utilizados, 150 Kg na estrada e 10 Kg no carro do Ciro... ao final, possivelmente descobrimos um gênio: Picasso nas telas; Gaudi na arquitetura; Aleijadinho no gesso e madeira; Donatello no Bronze; Zéca Diabo na pedra e Saquetti no cal.
Falando em marcação, o que acharam das tochas?! Putz! Deve ter sido muito legal vê-las no escuro “abrindo verdadeiros portais para o inferno” (de acordo com alguns participantes).
Voltando aos voluntários, o que dizer do Cássio Damiani então?! Nosso editor de vídeos, fotógrafo e motorista na “van dos degredados”. Ou do Zezo “Velhão” do Brazil, motorista na “bongo dos desiludidos”. Ou do William (que não pôde participar pois se operou da fimose – acho - na semana que antecedia a prova), pilotando uma das motos da organização. Por fim, minha cunhada Letícia, profissional de enfermagem, acompanhando os ciclistas no final da prova ou dos coroas: meu pai no PC3 e o pai do Ciro, pilotando a churrasqueira no final da prova. Augusto e mestre Bosa no PC2, Paulão e Toxiro na linha de chegada. Sem esse corpo de voluntários, não há como organizar um evento desse. Os próximos estarão condicionados a disponibilidade desse corpo de voluntários.
Inumeráveis desistências aconteceram a partir do PC4. Três quartos da prova já haviam sido vencidos na altura do PC4. À exceção do Viramesa, que chegou ao PC4 por volta das 20h em estado de choque, tenho certeza que todos os demais estão arrependidos por não terem dado “um gás” a mais. Muitos diziam não mais conseguirem pedalar. Mas se ainda conseguiam caminhar, isso estava dentro da regra e era uma arma que deveria ter sido utilizada.
Organizar uma prova pioneira trouxe a tona algumas discussões. Desde o início não tivemos interesse em homologar. As razões são conhecidas, pois já elencadas em postagens anteriores. Certa vez ouvi que o Audax/Randonnée no Brasil estava organizado como um feudo. Como nosso país tem dimensões continentais, quem residir longe dos “feudos” que promovem audax/randonnée, está praticamente fora de provas mais emocionantes (extenuantes) que um brevet de 200 Km. Completar uma série, para quem reside há mais de 500 km de uma organização que promova uma série completa, é financeiramente temerário. O único argumento plausível para proibir alguém de “pular” um brevet de menor distância é a falta de experiência deste participante, expondo a organização e ciclista a perigos e preocupações demasiados. Como regra de bom-senso, porque não permitir que ciclistas que já possuam uma série completa (portanto, conhecedores dos perigos e esforços necessários a conclusão de uma série), possam participar de provas que lhe pareçam atraentes e pitorescas, promovendo maior interação entre ciclistas de clubes distantes no país e valorizando esforços de organizações que promovem brevets longos?! Hoje, um brevet de 600 km está restrito a um participante que fez 200, 300 e 400 km naquele ano (série). Porque não ampliar as possibilidades, estendendo o convite a todo e qualquer ciclista que já tenha concluído uma prova de 600 km em sua vida?!? Ainda, alguém pode pensar... mas é possível, pelo regulamento transnacional BRM “pular” brevets? SIM, É POSSÍVEL.
A organização do Audaxterra foi acusada de bruxaria (pirataria) pela santa inquisição, presente em alguns feudos. À época quase fui para a fogueira. É provável que após tecer esses comentários blasfemos, eu seja queimado vivo. No entanto, estou convicto, pois a causa é justa. Quero com esta argumentação abrir uma discussão e a consequente flexibilização de alguns aspectos da “dogmática” brasileira de BRMs. Fiquem livres para comentar.

Abraço a todos e até o próximo Audaxterra!








Obs.: já havia desistido de fazer esta postagem, algumas coisas, quando deixam de serem ditas no tempo certo, perdem sua pertinência. Mas ao assistir a edição apaixonada do Fábio “Negão” Vieira, divulgada no youtube, fiquei inspirado.

Obs.2: o próximo Audaxterra será, provavelmente, em 2013. Arestas serão aparadas, bem como algumas alterações no percurso promovidas, além de estar presente no calendário oficial.

4 comentários:

Fábio Negão Vieira disse...

Maico,

Desde que resolvi participar desta insana aventura, fiquei maravilhado com as palavras por ti redigidas neste blog. São de uma cultura lapidada.

Blá blá blás de lado, imagino a dificuldade que é organizar e realizar uma prova como esta e ainda bem que existem pessoas como as citadas, que incorporam o espírito da coisa e fazem com que seja possível.
Fico triste em saber que este ano não haverá outra edição, pois, depois de comentar o feito com vários amigos da região norte, a grande maioria ficou com vontade de participar, pelo menos no discurso, essa foi minha impressão.

Um grande abraço e no que depender de mim, na próxima edição, o norte será muito bem representado.

Fábio Negão Vieira

dmmg disse...

Eu imaginava que deveria haver alguma forma de pular brevets, isso pelo fato de haverem duas medalhas francesas distintas, uma para os 600km e a Super Randonneur. Como há uma distinção especial para aqueles que fazem TODA a série no mesmo ano, era de se esperar que nem todos são obrigados a isso, senão não teria sentido. Agora, qual seria o critério oficial mundial para pular brevets? Teriam os brevets menores validade de mais de 1 ano?

João Paulo Saboia disse...

Independente de homologada pelos franceses ou não, a prova foi muito boa, com um valor de inscrição bastante acessível tendo em vista a boa sinalização da prova, troféus, jantar, etc.

A grande maioria das minhas pedaladas, inclusive as mais difíceis fiz por conta própria na estrada e pouco me importa se alguém lá de não sei onde coloca o meu nome em alguma lista dizendo que eu já fiz isso. Não preciso de provas de longas distância pra pedalar, assim como acredito que muita ou pouca gente também faz isso, mas acho legal participar de provas, pedalar com mais gente, trocar experiências. Todos crescem com isso.

Sendo provas bem organizadas, tanto faz se tem homologação ou não, acho que se queremos ver o ciclismo amador de longa distância crescer no Brasil, temos de nos unir e fazer o que pudermos, seja incentivando outros ciclistas, seja organizando provas, quanto maior o leque de opções tivermos para acomodar as diferentes 'etnias de bicicleteiros' melhor será.

Se pudesse gostaria de fazer apenas o brevet de 1000 km este ano, ou poder começar no 400 ou 600 km. Economizaria uma grana e faria as provas que me interessam mais. Talvez isso até ajudaria a ter mais inscritos nas provas mais longas, que geralmente contam com poucos ciclistas. Mas acho que é uma questão de conversar e esclarecer o que realmente é possível ou não em termos de homologação. Ou pelo menos liberar todas as provas a qualquer participante, mas homologando apenas os que estiverem com brevets em dia.

Enfim, acho que o Brasil está avançando e fico no aguardo da próxima prova aí em Urussanga!

Viramesa disse...

Fiquei surpreso ao ver este post. E mais uma vez parabenizo a organização e a todos os participantes deste evento .Não sou o que se pode chamar de atleta, já fui "derrotado" duas vezes nesta região, uma na tentativa do 300 do carvão em 2009 e nesta do 200 terra, no fodax, estuprax, audaxterra ou qualquer nome que queiram dar a esta prova.
Sia de minha cidade achando que chegaria apenas no primeiro PC, consegui chegar próximo aos 155-160km, uma grande vitória.
Não me considero solitário como posto no texto, uma vez que sempre reencontro e faço amigos neste tipo de evento, onde as vaidades são deixadas de lado e você vale o que realmente é.
É díficil explicar, mas o clima amistoso entre pessoas que nunca se viram, que moram a kilomentros de distância e que mesmo antes de começar a prova, já mostram um entrosamento pouco visto hoje em dia.

Este ano fui sozinho, mas tenho certeza que em 2013 arrasto mais alguns comigo.

Em 2009 conheci o Audax em Floripa, de uma brincadeira por MSN reolvi participar,saindo novamente da minha cidade sozinho. Em 2010 mais dois amigos me acompanharam, ano passado fomos em 9 e este ano iremos em mais de 30.

O ciclismo de longa distância só atem a crescer porque além da superação pessoal, o espírio encontrado nesta prova é extremamente cativante e nos faz sempre querer voltar.

Abraços e até 2013 ou antes, quem sabe...